Paz aos homens de boa vontade
Postado: 11 janeiro 2017 20:42h
Autor: Revista Espírita de fevereiro de 1863
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(Poitiers. Reunião preparatória de operários espíritas.
Médium: Sr. X…)

Meus caros amigos, a vida é curta; grande é a que a precede, grande é a que a sucede. Nada acontece sem a vontade de Deus. Consequentemente, tudo só passa de legítima e alta justiça. Vossa miséria, quando vos aperta, é um mal merecido, uma punição, não duvideis, de faltas anteriores. Encarai-a com bravura e erguei os olhos para o alto com resignação: a bênção e o alívio descerão. Por vezes vossos pesares são a prova pedida pelo vosso próprio Espírito, desejoso de chegar prontamente à meta final, sempre entrevista no estado de desencarnado.

No momento em que o mundo se agita e sofre, em que as sociedades, em busca do que é verdadeiro, se contorcem num parto laborioso, Deus permite que o Espiritismo, isto é, um raio da eterna verdade, desça das altas regiões e vos esclareça. Nosso objetivo é mostrar-vos o caminho, mas vos deixar a liberdade, ou seja, o mérito e o demérito de vossas ações. Escutai-nos, pois, e ficai certos de que a vossa felicidade é, para nós, uma viva preocupação. Se soubésseis quanto vossas más ações nos afligem! Quanto os vossos esforços para a lei de Deus nos enchem de alegria! O Senhor nos disse: “Servidores do meu império, apóstolos devotados da minha lei, a todos levai a minha palavra; a todos explicai que a vida eterna será a dos que praticam o Evangelho; a todos os homens fazei entender que o bem, o belo, o grande, degraus de minha eternidade, estão contidos numa palavra: Amor.” O Senhor nos disse: “Espíritos velozes, correi a todos: aos mais infelizes e aos mais felizes; do rei ao artesão; do fariseu ao que se queima em ardente fé.” E nós vamos a todos os lados e gritamos: aos infelizes, resignação; aos felizes: caridade, humildade; aos reis: amor aos povos; ao artesão: respeito à lei!

Meus amigos, no dia em que fizerem mais que nos escutar, isto é, no dia em que praticarem nossos preceitos, não mais egoísmo, não mais inveja. Partindo daí, não mais misérias, não mais esse luxo, que é o verme que corrói a sociedade e a enfraquece; não mais esses erros morais, que perturbam as consciências; não mais revoluções, não mais sangue! Não mais esse triste preconceito que fez com que as famílias principescas acreditassem que o povo era coisa sua e que elas eram de outro sangue; não mais nada, senão a felicidade! Vossos governos serão bons, porque governantes e governados terão aproveitado do Espiritismo. As ciências e as artes, levadas nas asas da divina caridade, elevar-se-ão a uma altura que não suspeitais; vosso clima, saneado pelos trabalhos agrícolas; vossas colheitas mais abundantes; essas palavras tão profundas de igualdade e fraternidade, enfim interpretadas sem nenhum sonho a despojar aquele que possui, realizarão, eu vo-lo afirmo, as promessas do vosso Deus. “Paz, disse o seu Cristo, aos homens de boa vontade!” Não obtivestes a paz porque não tivestes a boa vontade. A boa vontade, tanto para os pobres quanto para os ricos chama-se caridade. Há caridade moral, como há caridade material; e não a tivestes; e o pobre foi tão culpado quanto o rico!

Escutai-me bem: Crede e amai! Amai: muito será perdoado a quem muito amou. Crede: a fé transporta montanhas.

Prudência e doçura no apostolado novo: vossa melhor exortação será o bom exemplo. Lamentai os cegos: os que não querem ver a luz. Lamentai, mas não censureis! Orai, meus amigos e a bênção de Deus será com as vossas almas. O facho da vida irradia; de todos os recantos do horizonte iluminam-se faróis; a tempestade vai sacudir e talvez quebrar os barcos! Mas o navegante que, sobre a vaga furiosa, olhar sempre o farol, atracará à costa e o Senhor lhe dirá: “Paz aos homens de boa vontade; sê bendito, tu que amaste; sê feliz, pois trabalhaste pela felicidade do próximo. Meu filho, a cada um segundo suas obras!”

F. D., antigo magistrado
Revista Espírita, fevereiro de 1863, p. 97

Assim, pois, o Espiritismo se fundamenta em princípios gerais independentes de toda questão dogmática. É verdade que ele tem consequências morais, como todas as ciências filosóficas. O Espiritismo NÃO é, pois, uma religião. Do contrário, teria seu culto, seus templos, seus ministros. Sem dúvida cada um pode transformar suas opiniões numa religião e interpretar à vontade as religiões conhecidas, mas daí à constituição de uma nova igreja há uma grande distância e penso que seria imprudência seguir tal ideia. Em resumo, o Espiritismo ocupa-se da observação dos fatos e não das particularidades desta ou daquela crença; […]

— Allan Kardec, Revista Espírita, Maio/1859/ “Refutação de um artigo de “L ‘Univers”